As mensagens do Legislativo
: Andreia Tarelow
O Senado Federal
aprovou, para um novo mandato, o Procurador-Geral da República, Paulo Gonet. A
votação foi apertadíssima: ele precisava de 41 votos e obteve 45. De certa
forma, essa votação foi, a meu ver, um recado à Suprema Corte.
Tenho com Paulo Gonet uma amizade de mais de 30 anos. Sempre
o admirei como professor e como diretor do Instituto de Direito Público (IDP),
fundado pelo Ministro Gilmar Mendes. De ambos recebi o título de Professor
Honoris Causa do Instituto de Direito Público, o que muito me honrou.
Paulo Gonet é um profundo conhecedor do Direito Público no
Brasil, um grande jurista e uma nobre figura, com sólidas convicções religiosas,
razão pela qual entendo que a votação apertada tenha sido uma indireta do
Congresso ao Supremo Tribunal Federal.
Ocorre que, merecidamente, ele foi indicado Procurador-Geral
da República pelo Ministro Gilmar Mendes, com apoio total dos onze Ministros do
Supremo.
Contudo, a linha que o Supremo Tribunal Federal adotou, de
ser também legislador —, ou seja, de substituir o Poder Legislativo em muitos
momentos (desde o artigo 19 do Marco Civil da Internet, passando pela
anencefalia, marco temporal das drogas e pelo casamento de homossexuais, que
são matérias de competência do Legislativo) — é o que causa um desconforto
muito grande ao Legislativo.
Acredito, ainda, que essa mensagem do Poder Legislativo tenha
também o presidente Lula como destinatário, haja vista a indicação do futuro
Ministro da Corte que irá substituir o Ministro Luís Roberto Barroso.
Conheço Jorge Messias. Ele é um candidato natural, de
confiança do presidente Lula, bom advogado e com sólida formação cristã.
Tenho a sensação, entretanto, de que seu apadrinhamento
também gera desconforto ao Senado Federal, que gostaria de ter como candidato o
ex-presidente da Casa, Rodrigo Pacheco, que foi muito alinhado com o presidente
Lula, a ponto de colocar em discussão no Senado apenas aquilo que agradava o
presidente petista. Ele tem livre trânsito no Senado e é o candidato do
presidente do Legislativo.
Fato é que a votação apertada para um jurista brilhante como
Paulo Gonet — por ele ter tido o apoio total do Supremo, o que gera grande
desconforto a uma área considerável do Senado pela invasão de competência do
STF em sua competência legislativa —, faz com que haja uma preocupação na
indicação do futuro ministro do Supremo pelo presidente Lula. Ora, a atuação do
Supremo, ao legislar naquilo que a Constituição manda ser competência exclusiva
do Congresso Nacional (art. 49, inciso XI), é o ponto central dessa tensão.
Tal votação foi, portanto, um alerta e uma mensagem. Cabe
agora ao Presidente da República negociar com os senadores, caso queira manter
a candidatura de seu fiel escudeiro, Jorge Messias, que é um homem de
convicções cristãs e de boa formação moral, mas que parece não ter no Senado o
apoio que necessitaria para ser aprovado.
Pessoalmente, sempre pensei que, mesmo na época em que
vivíamos um regime de exceção militar, os responsáveis indicavam nomes de
professores de notável saber. Se analisarmos os que foram indicados naquele
período — Moreira Alves, Oscar Dias Corrêa, Moacyr Amaral Santos, Thompson
Flores, etc. —, perceberemos que eram todos titulares em grandes universidades
do Brasil.
Perdemos um pouco esse critério de nomear grandes juristas,
passando a indicar pessoas com atuação na área jurídica de conhecimento geral,
menos de notável saber e mais de notório conhecimento por parte da
população.
De qualquer modo, o presidente Lula deve ter sentido que terá
que trabalhar para conseguir que seu candidato a ministro do Supremo venha a
ser aprovado pelo Senado.
O episódio da votação de Paulo Gonet e a iminente indicação
ao STF de Jorge Messias revelam uma grave falha na governança federal: a
politização excessiva de instituições que deveriam primar pela técnica e
impessoalidade.
Ao insistir em um nome como Jorge Messias, notório por sua
lealdade pessoal e política em detrimento de um perfil de "notável saber
jurídico" inquestionável — critério histórico e de excelência —, o Governo
Federal prioriza o alinhamento ideológico e a blindagem política dentro da
Corte Suprema. Essa estratégia não apenas desrespeita o Senado, ao tentar impor
um nome, como também mina a confiança pública na independência do Poder
Judiciário, transformando a mais alta corte do país em um mero reflexo do Poder
Executivo e perpetuando um ciclo de indicações que favorecem a proximidade em
vez da competência supr apartidária, enfraquecendo o sistema de freios e
contrapesos democrático.
Vamos acompanhar o que acontecerá nos próximos meses dessa
jogada exclusivamente política, que deveria ser apenas jurídica.
Ives
Gandra da Silva Martins é professor emérito
das universidades Mackenzie, Unip, Unifieo, UniFMU, do Ciee/O Estado de São
Paulo, das Escolas de Comando e Estado-Maior do Exército (Eceme), Superior de
Guerra (ESG) e da Magistratura do Tribunal Region al Federal – 1ª Região,
professor honorário das Universidades Austral (Argentina), San Martin de Porres
(Peru) e Vasili Goldis (Romênia), doutor honoris causa das Universidades
de Craiova (Romênia) e das PUCs PR e RS, catedrático da Universidade do Minho
(Portugal), presidente do Conselho Superior de Direito da Fecomercio -SP,
ex-presidente da Academia Paulista de Letras (APL) e do Instituto dos Advogados
de São Paulo (Iasp)..
