O chamado orçamento secreto é a mais nova investida contra os legítimos
interesses da população brasileira, na medida em que sequestra parte importante
dos impostos que os cidadãos recolhem aos cofres públicos para atender a um só
objetivo: garantir a reeleição dos políticos que estão no poder, em que pese
haver uma minoria que discorda desse jeito de governar.
Atender prioridades e metas construídas a partir do conhecimento pleno
da realidade como exige o art. 165 da Constituição, empregar os recursos para
reduzir as desigualdades sociais e regionais, promover o desenvolvimento,
enfim, assegurar que cada brasileiro tenha uma vida digna não passa pela cabeça
da maioria dos políticos que habitam Brasília.
Nosso orçamento foi
abatido com armas e gente poderosas, por políticos que se deixam seduzir por
interesses paroquiais, de grupos e, fundamentalmente, de corporações.
O sistema de
planejamento e orçamento criado pelo constituinte de 1988 já não tem,
infelizmente, nenhuma importância, pois não faz mais sentido pensar num plano
plurianual que forneça as diretrizes, os objetivos e as metas da administração
pública para os próximos quatro anos e tampouco numa lei que estabeleça
anualmente as metas e prioridades a serem contempladas na lei orçamentária
anual.
Os ataques ao
orçamento não começaram agora. A produção sistemática de rombos orçamentários
nas últimas décadas gerou um endividamento gigantesco, as vinculações de
receitas não param de crescer, ainda que criadas por motivos nobres mas que
produzem mais ineficiências do que resultados realmente positivos.
O Plano Real e a Lei
de Responsabilidade Fiscal foram um sopro de esperança mas estão se esvaindo
pela ação política dos últimos tempos. A inflação dos recentes 12 meses
acelerou rapidamente e já passa dos 10%. Fez-se em 2016 um teto de gastos para
estancar a irresponsabilidade fiscal, mas neste finalzinho de ano foi
indelevelmente arranhado para atender interesses exclusivamente eleitorais.
Em 2015 foram criadas
as emendas parlamentares individuais, de execução obrigatória, na base de 1,2%
da receita corrente líquida. Nada de seguir uma eficiente escala de prioridades
e metas. Não contentes, nossos congressistas decidiram em 2019 praticamente
dobrar as apostas, sem risco de perder, criando um outro tipo de emenda: as
emendas de bancada, em que 1% da receita corrente líquida é distribuída a
estados e municípios de comum acordo entre as bancadas estaduais do Congresso
Nacional.
De novo: nada de
prioridades, nada de metas e tampouco de eficiência.
Voltando ao chamado
orçamento secreto, uma barbaridade por excelência, os políticos de Brasília,
não todos, viram-se em apuros, pois a sociedade ficou sabendo de sua existência
e botou a boca no trombone. Acionado, o Supremo Tribunal Federal estancou,
liminarmente, aquela manobra.
E agora? O que fazer
para ganhar as eleições de 2022, dada essa “intromissão” do STF, pensou aquele
grupo majoritário de políticos de Brasília.
Como esperado e sem
surpresas, a Câmara dos Deputados e o Senado Federal se apressaram na aprovação
de uma resolução regulamentado o orçamento secreto, que, segundo os entendidos,
continuará secreto e mandando às favas o processo de planejamento.
A expectativa de como
se pronunciaria o STF naquela infeliz questão restou totalmente frustrada, pois
a relatora Ministra Rosa Weber, que havia concedido a liminar, liberou o
pagamento das emendas em razão da regulamentação editada dias antes pelo
Congresso Nacional, no que foi seguida pelo Plenário daquela Corte.
Terminou o artigo?
Não.
Aprovar normas gerais
sobre orçamento pode ocorrer por meio de mera Resolução do Congresso Nacional?
Evidentemente, o que foi feito é uma afronta à Constituição, em particular
contra o que diz o § 9 do art. 165.
Segundo esse
dispositivo, somente lei complementar pode: (i) dispor sobre o exercício
financeiro, a vigência, os prazos, a elaboração e a organização do plano
plurianual, da lei de diretrizes orçamentárias e da lei orçamentária anual;
(ii) estabelecer normas de gestão financeira e patrimonial da administração direta
e indireta bem como condições para a instituição e funcionamento de fundos.
Já faz 33 anos que
deputados e senadores estão devendo à sociedade brasileira a edição dessa lei
complementar, pois a velha e surrada Lei nº 4.320/1964 tornou-se absolutamente
anacrônica.
É espantoso constatar
como o Congresso Nacional foi célere em aprovar as normas de funcionamento do
orçamento secreto, que, como já foi dito, continuará secreto, e mantém-se
negando a edição da referida lei complementar que poderia mudar de forma
definitiva a atual cultura de elaboração e execução das leis que compõem nosso
sistema de planejamento e orçamento determinado pelo art. 165 da Constituição.
Quem sabe algum dia
nosso orçamento, abatido e capturado nos últimos tempos, possa ser resgatado em
favor do soido povo brasileiro.
* Walter
Penninck Caetano, economista e diretor da Conam; José Carlos
Polo, economista e consultor técnico da Conam.
Por Walter Penninck Caetano e José Carlos Polo*
O chamado orçamento secreto é a mais nova investida contra os legítimos interesses da população brasileira, na medida em que sequestra parte importante dos impostos que os cidadãos recolhem aos cofres públicos para atender a um só objetivo: garantir a reeleição dos políticos que estão no poder, em que pese haver uma minoria que discorda desse jeito de governar.
Atender prioridades e metas construídas a partir do conhecimento pleno da realidade como exige o art. 165 da Constituição, empregar os recursos para reduzir as desigualdades sociais e regionais, promover o desenvolvimento, enfim, assegurar que cada brasileiro tenha uma vida digna não passa pela cabeça da maioria dos políticos que habitam Brasília.
Nosso orçamento foi abatido com armas e gente poderosas, por políticos que se deixam seduzir por interesses paroquiais, de grupos e, fundamentalmente, de corporações.
O sistema de planejamento e orçamento criado pelo constituinte de 1988 já não tem, infelizmente, nenhuma importância, pois não faz mais sentido pensar num plano plurianual que forneça as diretrizes, os objetivos e as metas da administração pública para os próximos quatro anos e tampouco numa lei que estabeleça anualmente as metas e prioridades a serem contempladas na lei orçamentária anual.
Os ataques ao orçamento não começaram agora. A produção sistemática de rombos orçamentários nas últimas décadas gerou um endividamento gigantesco, as vinculações de receitas não param de crescer, ainda que criadas por motivos nobres mas que produzem mais ineficiências do que resultados realmente positivos.
O Plano Real e a Lei de Responsabilidade Fiscal foram um sopro de esperança mas estão se esvaindo pela ação política dos últimos tempos. A inflação dos recentes 12 meses acelerou rapidamente e já passa dos 10%. Fez-se em 2016 um teto de gastos para estancar a irresponsabilidade fiscal, mas neste finalzinho de ano foi indelevelmente arranhado para atender interesses exclusivamente eleitorais.
Em 2015 foram criadas as emendas parlamentares individuais, de execução obrigatória, na base de 1,2% da receita corrente líquida. Nada de seguir uma eficiente escala de prioridades e metas. Não contentes, nossos congressistas decidiram em 2019 praticamente dobrar as apostas, sem risco de perder, criando um outro tipo de emenda: as emendas de bancada, em que 1% da receita corrente líquida é distribuída a estados e municípios de comum acordo entre as bancadas estaduais do Congresso Nacional.
De novo: nada de prioridades, nada de metas e tampouco de eficiência.
Voltando ao chamado orçamento secreto, uma barbaridade por excelência, os políticos de Brasília, não todos, viram-se em apuros, pois a sociedade ficou sabendo de sua existência e botou a boca no trombone. Acionado, o Supremo Tribunal Federal estancou, liminarmente, aquela manobra.
E agora? O que fazer para ganhar as eleições de 2022, dada essa “intromissão” do STF, pensou aquele grupo majoritário de políticos de Brasília.
Como esperado e sem surpresas, a Câmara dos Deputados e o Senado Federal se apressaram na aprovação de uma resolução regulamentado o orçamento secreto, que, segundo os entendidos, continuará secreto e mandando às favas o processo de planejamento.
A expectativa de como se pronunciaria o STF naquela infeliz questão restou totalmente frustrada, pois a relatora Ministra Rosa Weber, que havia concedido a liminar, liberou o pagamento das emendas em razão da regulamentação editada dias antes pelo Congresso Nacional, no que foi seguida pelo Plenário daquela Corte.
Terminou o artigo? Não.
Aprovar normas gerais sobre orçamento pode ocorrer por meio de mera Resolução do Congresso Nacional? Evidentemente, o que foi feito é uma afronta à Constituição, em particular contra o que diz o § 9 do art. 165.
Segundo esse dispositivo, somente lei complementar pode: (i) dispor sobre o exercício financeiro, a vigência, os prazos, a elaboração e a organização do plano plurianual, da lei de diretrizes orçamentárias e da lei orçamentária anual; (ii) estabelecer normas de gestão financeira e patrimonial da administração direta e indireta bem como condições para a instituição e funcionamento de fundos.
Já faz 33 anos que deputados e senadores estão devendo à sociedade brasileira a edição dessa lei complementar, pois a velha e surrada Lei nº 4.320/1964 tornou-se absolutamente anacrônica.
É espantoso constatar como o Congresso Nacional foi célere em aprovar as normas de funcionamento do orçamento secreto, que, como já foi dito, continuará secreto, e mantém-se negando a edição da referida lei complementar que poderia mudar de forma definitiva a atual cultura de elaboração e execução das leis que compõem nosso sistema de planejamento e orçamento determinado pelo art. 165 da Constituição.
Quem sabe algum dia nosso orçamento, abatido e capturado nos últimos tempos, possa ser resgatado em favor do soido povo brasileiro.
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