COMO FUI APRESENTADO AOS JORNAIS


 

Por Edinei Muniz

 

Minha relação com a imprensa e o amor pela informação, especialmente aquelas do universo da política, começaram muito cedo, ainda na infância, e guardam relação direta com meu pai, o Seu Edilson, que foi um ativista, lutou contra a ditadura militar e sempre gostou muito de política e também de notícias de jornais.

 

Papai era um grande leitor e foi ele que inseriu em mim a paixão incurável por histórias  e estórias. Ele era um contador de histórias.

 

Desde que me conheço por gente, nunca vi faltar jornais lá em casa. Papai era do tipo que costumava ler jornais diariamente e os exemplares sempre eram facilmente encontrados pela casa.

 

Após o vencimento diário dos exemplares, ele, cuidadosamente, os guardava numa casinha que mantinha no fundo do quintal.

 

Anos depois, eu, já menino formado, sempre que o visitava, costumava passar horas e horas na casinha folheando e lendo fatos pitorescos da história política acreana do passado distante.

 

Papai era do antigo PTB, depois MDB e, em seguida, PMDB por toda a vida. Era adversário dos "rabo de couro", termo que era utilizado lá em Xapuri, não sei se também em outros lugares, para definir o pessoal da Arena (Aliança Renovadora Nacional), a base de apoio dos militares.

 

As crises com os militares, a campanha das Diretas Já, o processo de abertura e os debates referentes à Constituição de 1988, nunca deixaram de chegar aos meus ouvidos de menino, já que tais temas sempre estiveram presentes na fala do meu pai e nas manchetes dos jornais, como já dito, facilmente encontrados lá em casa.

 

Papai gostava tanto de jornais que a única surra que levei dele, por viver arengando com meus irmãos, foi, acreditem, de jornal. Jornal dobrado.

 

Apanhar de jornal dobrado é uma maravilha. Não dói lá essas coisas e papai nem chegou a utilizar a força máxima naquela única surra que levei dele.

 

O que fez mesmo foi ficar gritando a frase: "menino insubordinado! Menino insubordinado! Menino insubordinado! E eu nem sou  ou era insubordinado. Ou sou? Sou nada. Sou muito é ordeiro.

 

Eu era meio arengueiro e na hora da correção o fato de ser o caçula do papai acabava me garantindo algumas prerrogativas. Quem é o filho mais novo sabe bem do que estou falando.

 

Após o almoço, era quando papai, deitado no chão da sala, com minha cabeça no ombro dele, degustava as notícias dos jornais, que chegavam em Xapuri por volta das onze horas da manhã, eis que saíam de Rio Branco no ônibus das sete.

 

Antes daquele inesquecível ritual diário, papai costumava mimar o caçulinha dele com algumas canções antigas do seu tempo. O véi mandava bem.

 

Todos os dias, após o almoço, dormia  sempre ouvindo o mesmo repertório do papai. E nunca enjoei!

 

Adorava todas, especialmente uma que  começava assim: "Eu fui um samba lá no alto da Mangueira. Uma cabrocha me tirou de tal maneira..."

 

E tinha outra que era fantástica: "Aí Cariri, Cariri do meu Ceará, a saudade está danada qualquer dia eu vou voltar. Nas Serras do Araripe tem coisas pra gente ver, tem água pra todo lado e não precisa nem chover. Não  é como vocês falam as cidades do meu Ceará, pq lá tem água e se não acreditam vão lá. Está certo ou não está? Ai Cariri, Cariri do meu Ceará..."

 

Pois foi nesses mimos diários do meu querido pai após o almoço que fui me familiarizando com os jornais.

 

"Leia aqui meu filho", dizia ele para testar minha capacidade de leitura, eis que o insubordinado do papai estava em fase de alfabetização.

 

E foi indo! E foi indo! E fui pegando gosto pela leitura de jornais!

 

E foi assim que começou essa relação que carrego até hoje com notícias jornalísticas e com a política.

 

Tudo começou com papai.

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